quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Docentes encaram 3 turnos para driblar baixo salário


De acordo com levantamento do Inep, 10% dos professores do Paraná dão aula de manhã, de tarde e de noite para aumentar a renda

Para aproximadamente 11 mil professores paranaenses, as férias de julho são um momento completamente atípico em relação à sua rotina comum em dias letivos. Se os profissionais que trabalham 20 ou 40 horas esperam ansiosos por essa época do ano, para aqueles que optam por dar aulas em três turnos, descansar em casa é um luxo do qual só desfrutam em alguns fins de semana ou nas madrugadas, dormindo.

Esse é o drama de 10% dos docentes que atuam na rede pública de Educação no Paraná. Segundo a Sinopse Estatística da educação Básica, estudo anual realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) com dados do Censo Escolar, o número de professores que completam 60 horas semanais no estado é o maior da Região Sul e está acima da média nacional, que é de 7%.

A necessidade de rendimentos maiores aliada à possibilidade de se vincular a diferentes instituições são as primeiras motivações apontadas por quem escolhe uma rotina tão intensa. “É desgastante, mas sem isso não consigo manter uma Educação boa para minhas filhas”, diz José Odair de Souza, professor de Educação Física e pai de duas meninas com 5 e 10 anos que estudam na rede privada.

Pela manhã o professor atua numa escola municipal, em Santa Felicidade. À tarde e à noite, Souza trabalha em Almi­­rante Taman­daré, em um colégio do estado. Em todos os turnos, o professor passa a maior parte do tempo em pé. “Essa é a primeira vez em dez anos que tiro uma folga no meio do ano, porque antes eu passava julho nas colônias de férias”, conta o professor, que esporadicamente ainda apita torneios esportivos e gincanas nos fins de semana.

As viagens entre uma cidade e outra também fazem parte do dia a dia de Ana Dulce Amaral Rosa, professora de Artes numa escola municipal de Araucária pela manhã e pelo estado à tarde e à noite, dando aulas para turmas de 5.ª série ao Ensino Médio no bairro do Umbará.

Ana faz o trajeto diariamente de carro e mesmo assim conta que o tempo para almoçar é sempre curto. “Às vezes não dá, porque no intervalo entre uma escola e outra tem prova para corrigir ou aula para preparar”, diz.

Desigualdade

O município de Araucária é frequentemente citado como destino preferido dos professores da rede pública que assumem va­­gas em duas ou mais escolas em busca de complemento para a renda familiar. O principal atra­­tivo é o salário de R$ 1.675,76 por 20 ho­­ras semanais.

O valor é baixo se comparado a outras profissões de igual carga horária e relevância social semelhantes, mas su­­pe­­­rior ao pago pela capital (R$ 1.199,91) e maior do que o dobro oferecido pelo estado (R$ 825,22). Na vizinha Campo Largo, a prefeitura recentemente abriu vagas para docentes oferecendo o salário de R$ 757,32 pela mesma carga horária.

Essa diferença levou Clarissa Busato Peixoto a assumir como professora em dois períodos em Araucária, mesmo trabalhando próximo de onde mora no turno da manhã, em Curitiba. A variedade de faixas etárias e temas que precisa trabalhar também é grande.

Pela manhã Clarissa dá aula de Artes a turmas da Educação infantil ao 5.º ano; à tarde, em outra escola, é professora de Literatura e à noite trabalha na Educação de jovens e adultos. “Se fosse possível eu deixaria um dos períodos. É uma rotina de muito estresse, mas faço isso porque preciso”, diz a professora, que é casada e mora com os dois enteados na Cidade Industrial de Curitiba.

O acúmulo de turnos, no entanto, nem sempre está exclusivamente vinculado à necessidade de au­­mentar renda. A realização profissional é destacada por Regiane Alves da Silva como motivo para prosseguir com dedicação total à profissão.

Servidora da Educação pública há 20 anos, Regiane já foi diretora e hoje trabalha como pedagoga nas redes estadual e mu­­nicipal, além de dar aulas na formação de docentes para o estado pela manhã. “Eu gosto do que faço e é principalmente a formação de professores que aumenta minhas forças para continuar”, afirma.

A satisfação de Regiane com a profissão fica mais evidente quando se descobre que seu vínculo com a Educação não acaba com o fim do expediente. Nos fins de semana, além de fazer pós-graduação, ela é professora-coordenadora no projeto Comu­nidade Escola há três anos.


Rotina intensa afeta a saúde e a qualidade 

As 60 horas semanais que melhoram a condição financeira de milhares de professores são criticadas por analistas que consideram a rotina intensa um obstáculo para a qualidade do ensino e fator prejudicial à saúde.

Segundo a coordenadora do curso de Pedagogia da Universidade Positivo Gelsenmeia Massuquette Romero de Souza, a falta de tempo fora da escola afeta negativamente a qualidade da aula. “Não importa se o professor é novo ou experiente, ele precisa de um tempo pra planejar. Numa rotina de 60 horas não sobra nem para o descanso”, diz.

Para ela, 40 horas seriam o limite para manter uma rotina profissional saudável, na qual se pode avaliar a próprio desempenho no fim expediente e exercer bem a função no dia seguinte.

O inevitável desgaste da saúde desses trabalhadores é o que preocupa o médico cardiologista e professor da Pontifícia Uni­versidade do Paraná (PUCPR) José Rocha Faria Neto. Pesquisador da Síndrome de Burnout, doença descoberta na década de 70 ligada ao estresse profissional, o doutor aponta a classe docente como grupo bastante vulnerável ao problema. “Médicos e professores estão no topo da lista dos afetados pela síndrome, que surge do esgotamento físico e psicológico”, explica.

A doença se manifesta por meio de oscilações de humor, distúrbios do sono, dores de cabeça e dificuldades de concentração e deixa o paciente mais vulnerável ao enfarte. Além da síndrome, perda da voz, baixa imunidade e até anemia são outros dos problemas comuns a professores que passam longos períodos em sala de aula. 

  Fonte:  todospelaeducacao.org.br/

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Nenhum comentário:

Postar um comentário